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16/05/2016

10 perguntas sobre o Ciclo Completo de Polícia

Diversas Propostas de Emendas à Constituição – PECs estão em andamento na Câmara dos Deputados e no Senado Federal com o propósito de promover reformulações no Sistema de Segurança Pública Brasileiro. Nesse contexto, a Câmara dos Deputados realizou diversos Seminários em vários Estados do Brasil, para debater a adoção do Ciclo Completo de Polícia.

A cada seminário que acompanhei, sobre a implementação do Ciclo Completo de Polícia no Brasil, eu me convenci  mais de sua necessidade, e acima de tudo, por ter constatado ser uma questão de garantia de direitos e efetividade da atuação policial.

Após acompanhar esses valorosos debates, notei que algumas dúvidas são frequentes e que boa parcela da população ainda desconhece o assunto, existindo ainda, por parte de determinada categoria, com a utilização de argumentos falsos, tentativa de enganar essa parcela da população.

Diante disso, procurei elencar abaixo as dez perguntas mais frequentes sobre o tema, em uma lógica de perguntas e respostas, onde procuro explicar em breves palavras os principais pontos desta importante e necessária mudança.

1)                 O que é o Ciclo Completo de Polícia e quais Países o adotam?

Resposta: Ciclo Completo de Polícia consiste na atuação plena das instituições policiais, isto é atuar na prevenção, na repressão e na investigação. Esse é o modelo adotado na Europa, America do Norte e América do Sul, enfim, com exceção de três Países no mundo: Brasil, República de Cabo Verde e República Guiné-Bissau, todos os outros adotam o ciclo completo para as suas polícias.

2)                 As polícias estão preparadas para isso?

Resposta: Sim, segundo dados das secretarias de segurança pública, as ocorrências de menor potencial ofensivo correspondem a mais 80% das ocorrências policiais, e na maioria dos Estados do Brasil a Polícia Rodoviária Federal – PRF já lavra o Termo Circunstanciado de Ocorrência – TCO liberando as partes no local (com o compromisso de comparecem em juízo conforme prevê a lei 9.099/95) e a Polícia Militar (PM) já o faz em quatro Estados (RS, SC, PR e AL) e outros quatro já estão na iminência (DF, GO, MG e MS). Além do que, a Polícia Militar já possui o Inquérito Policial Militar, com as mesmas atribuições e finalidades do Inquérito Policial conduzido por Delegados, então a investigação já faz parte da atividade policial militar.

3)                  A investidura militar da polícia é compatível com o Ciclo Completo de Polícia?

Resposta: Sem dúvida, basta analisar que França, Itália, Holanda, Espanha, Portugal, Argentina e outros tantos Países com democracia consolidada, todos possuem polícia militar e atuam com o ciclo completo.

4)                  A PM abandonaria as ruas deixando a atividade ostensiva/preventiva para um segundo plano?

Resposta: De forma alguma, o parâmetro internacional de efetivo investigativo é de 13% do efetivo ostensivo (de policiamento uniformizado), com a ineficiência do atual modelo, 100% do efetivo das polícias ostensivas, maiormente das polícias militares, ficam horas em deslocamentos e procedimentos burocráticos.

Com a adoção do ciclo completo, toda a ação policial ocorreria, via de regra, no local da infração, liberando o efetivo, com maior rapidez e eficiência, para retornar a atividade de policiamento e sempre permanecendo na região a ser guarnecida.

5)                  Os cidadãos aceitariam que os registros de ocorrências fossem feitos nos quartéis?

Resposta: Sim. Esta pergunta é costumeiramente usada por quem não possui argumentos e quer fazer referência ao regime de exceção, a própria comissão nacional da verdade concluiu que as torturas do regime de exceção ocorreram em sua maioria nas Delegacias, e nem por isso os infratores deixam de ser levados para lá, então os críticos a este avanço tem que observar o novo momento que País se encontra. Ademais, quem tem experiência de vivência policial, sabe que muitas vezes os cidadãos já vão aos quartéis em busca de ajuda, e com a filosofia de polícia comunitária, o convívio dos cidadãos com o ambiente policial militar é frequente e harmonioso, uma relação de parceria, em que ambos se ajudam por uma sociedade melhor, e quanto ao infrator, o tempo de permanência seria somente o necessário a lavratura do flagrante devendo ser encaminhado ao estabelecimento penal correspondente.

6)                 O Judiciário e o Ministério Público conseguiriam responder as demandas?

Resposta: Sim, e vale acrescer que há alternativas para esta temática. Primeiramente vale ressaltar que este também é um argumento de quem quer se opor a toda e qualquer evolução, tentando atrelar um problema a outro. Se fossemos analisar pura e simplesmente o número de processos e a população carcerária, poderíamos então extinguir as polícias, uma vez que não há vaga para mais ninguém nos estabelecimentos penais, e viveríamos então em um verdadeiro estado de caos social! Então a sociedade não pode ser enganada por quem não quer realmente evoluir. O sistema de segurança pública como um todo tem que melhorar, mas o atraso em um de seus aspectos, por exemplo: presídios, não pode obstaculizar outras melhorias necessárias, como a reforma das competências das polícias. Secundariamente, o modelo de ciclo completo viabiliza, com a devida aprovação legislativa, a possibilidade de competência formal para conciliação por parte dos policiais na ponta da linha, que na prática já são os maiores conciliadores, e o fariam formalmente, com respaldo técnico e jurídico, acordos estes que seriam fiscalizados pelo Ministério Público e homologados pelo Judiciário, auxiliando na redução do número de processos no Poder Judiciário e desafogando o sistema como um todo.

7)                  Como ficariam duas polícias de ciclo completo na mesma região?

Resposta: Muito melhor do que hoje, pois cada polícia atuaria de forma plena, do início ao término da ocorrência, diminuindo assim a interdependência que existe hoje, onde nenhuma das duas consegue prestar um serviço completo aos cidadãos. Nos EUA, por exemplo, há mais de 18 mil agências policiais de ciclo completo e muitas vezes atuam na mesma área territorial, e nem com dezoito mil polícias há tantos conflitos como ocorre no Brasil com apenas duas “meias polícias” em cada Estado.

8)                 O Ciclo Completo representa mais trabalho para quem atua na base das polícias?

Resposta: Pelo contrário, mais trabalho tem o policial com a necessidade atual de deslocar horas para chegar a uma delegacia e ficar por tempo indeterminado esperando para se atendido, chegando em alguns casos a passar praticamente um serviço inteiro com uma única ocorrência, ao invés de policiar as ruas! Qual policial com alguns anos de experiência de rua nunca passou por isso? Com o ciclo completo, nas infrações de menor potencial ofensivo as partes podem ser liberadas no local, e nas de maior potencial ofensivo, a própria polícia que efetuar a prisão fará os demais atos. É uma agilidade e economia muito maior, será menos trabalho para quem está na ponta da linha, pois cada ação será devidamente valorizada, e cada atuação que o policial fizer terá consequências legais para o infrator, o que hoje infelizmente sabemos que nem sempre ocorre.

9)                 Não seria melhor que cada polícia se especializasse no seu trabalho, como nos sistemas de produção e gestão empregado por Henry Ford e se aumentasse o efetivo das polícias civis?

Resposta: De forma alguma, isso seria insistir no erro.

Primeiramente, quanto a comparação de cada polícia apenas se especializar na sua atuação, com o sistema de produção de Henry Ford (ilustrado inclusive no filme “tempos modernos” com o cineasta Charles Chaplin), vale trazer as palavras da própria critica técnica[1] quando se referiu ao modelo de trabalho fracionado e repetitivo do sistema:

“o trabalho era fragmento para ser simplificado, com ciclos operatórios curtos, requerendo pouco tempo para a formação e treinamento dos trabalhadores, o que permitiu que o serviço fosse feito por operários e pessoas simples da plebe, sem grande formação, como inclusive relatou o personagem clássico de Charles Chaplin.” (G.N.)

Na verdade, é exatamente assim que alguns desejam que seja o trabalho policial militar, como uma atividade que não precisa de qualificação, que poderia ser executada por qualquer pessoa, “simples da plebe”, mas na verdade é o contrário, a pessoa que incorporará a figura do Estado, com autoridade suficiente para portar uma arma e interferir nos direitos dos cidadãos, tem que ser um profissional de alta qualificação, com amplo conhecimento social e capacidade de se aproximar e estreitar relações com a sociedade.

E a crítica técnica ao sistema fracionado de produção, ainda afirmou que “consistia em atividade repetitiva, parcelada e monótona, perdendo o trabalhador suas qualificações, as quais são incorporadas à máquina.” De fato, no modelo atual toda vez que um policial se depara com uma ocorrência, qualquer que seja sua gravidade, só faz uma única coisa: leva ao Delegado! Então assim, a crítica técnica feita há anos, se mostra uma verdade até hoje, e esse modelo fracionado se mostra uma forma de engessar a atividade policial, e como disse a crítica, “se perde toda a qualidade do trabalhador”, que poderia atuar com muito mais eficiência, fazendo composições, liberando as partes no local ou até mesmo investigando a infração que atendeu, otimizando assim em muito o serviço para a população.

– Quanto a aumentar o efetivo policial civil acredito que seria investir em um sistema de “meias polícias” que já provou não dar certo, mas trarei as palavras de um estudioso sobre o sistema de segurança pública, o Tenente-Coronel Marcello Martinez Hipólito, Mestre em Gestão de Políticas Públicas pela Universidade do Vale do Itajaí e que teve a oportunidade de conhecer in loco diversas polícias em outros Países, ele escreveu um artigo comparando o sistema de segurança pública com o fim das ineficientes lâmpadas incandescentes[2], concluindo pela necessidade de seu urgente aperfeiçoamento. Parte do artigo diz:

“Em todos os estados as polícias civis reclamam da falta de efetivo. Suponhamos então que fossem atendidos em seus reclamos e se dobrasse o efetivo, então teríamos aumentado sua eficiência na apuração de infrações penais de 5% para 10%, na média, e nos crimes contra o patrimônio de 1% para 2%.”

Enquanto é de 12% a 13% a média mundial de pessoal de um departamento de polícia na atividade de polícia judiciária, no Brasil essa média gira em torno dos 30%.”(G.N.)

“É assim em grande parte das milhares de agências policiais dos Estados Unidos ou mesmo nos países sul-americanos ou europeus. A conclusão que se pode tirar é que tentar melhorar o atual sistema policial seria o mesmo que querer continuar investindo na melhoria da lâmpada incandescente.”(G.N.)

10)  Não seriam os Delegados os garantidores dos direitos das vítimas/infratores, como dizem alguns?

Resposta: Não, a garantia de um direito não se da pela atuação isolada de nenhuma autoridade, mas sim pelo conjunto, pelo sistema de segurança pública como um todo, que passa desde a prevenção, o atendimento da ocorrência, o reestabelecimento da ordem pública, a investigação, o processo, a punição e a ressocialização. Todas as autoridades envolvidas são importantes para a garantia dos direitos.

Se fosse para expressar destaque a um profissional, dentre os diversos atuantes no sistema de segurança pública, eu indicaria o Soldado da Polícia Militar, e a razão é simples, enquanto todos correm do perigo, via de regra, o soldado é quem vai ao encontro dele, é o soldado quem é ferido no combate, é o soldado (estatisticamente) a maior vítima de homicídio em serviço, alguns dizem que o Brasil é um País com grande índice de letalidade da ação policial, mas poucos reconhecem que aqui é onde o policial mais morre no exercício de sua missão, então se tiver que escolher um profissional como destaque, eu diria que esse maior garantidor dos direitos é o Soldado da Polícia Militar, e que o ciclo completo de polícia trará, pelas razões já citadas, o devido reconhecimento de sua atuação e a otimização de seu serviço em prol da sociedade.

                                                                                                             Fonte: Agência FENAPEF